Era uma vez, muitas vezes....
em que ao acordar, se não sabe bem do tempo...
vê-se claramente que escorre, lento e viscoso, pelas paredes,
mas.....não nos diz se é de ontem ,
se de hoje...se já de amanhã...
uma mescla de agonia, misturada com alivio, invade-nos.....
ou invadiu nos,
ou seremos por ela invadidos
é algo difuso
e que se nao esclarece nunca....
os pés,
ao procurarem o chão,
dividem se entre o tempo em que lá chegarão
ou chegam,
ou já chegaram
e o medo (ou será esperança)
de pousarem num qualquer
não espaço e
não tempo.....
nota-se, muito ao longe,
mesmo para mim mesmo,
um ligeiro sorriso nos labios....num rosto que presumo ser meu
(eis-me pois, mago, capaz de substituir um vazio por outro, trocar nada por nada, e ficar a ganhar).
no tempo que o tempo leva
a não se decidir que tempo é, afinal,
o gesto das pernas eterniza se,
entre o morno da cama
e o chão que nem sei ao certo
se lá estará
se lá chegar...,
quando chegar...
posso desenhar galáxias novas,
um planeta ou outro....
(tenho sempre que me lembrar, depois, de lhes dar nomes)
e, em dias mais luminosos,
por dentro,
e já vão sendo poucos,
mesmo uma estrela,
ou outra....
(e é sempre mais difícil nomear estrelas....)
ou, lembrar-me até,
de um ou outro gesto que terei feito,
e, que de facto mudou,
ou mudaram,
ou irá para sempre mudar,
o curso da história...
depois, porque o tempo insiste
em não o ser,
por enquanto,
lembro-me devagar
que talvez não o tivesse feito,
apenas desenhado,
tenha sido ontem,
amanhã....
hoje, quem sabe.....
Os mesmo lábios,
que há pouco quase sorriram,
desenham agora desagrados:
duma qualquer forma incomoda-me o visco que,
num tempo qualquer,
me parece escorrer pelas paredes....
longe, lá muito ao longe,
senão no espaço, no tempo,
é-me, na altura, igual,
num rádio inexistente,
numa casa qualquer,
que, duma forma ou doutra,
nem existiu,
nem vai existir,
nem existe,
soam as palavras de Dante...
de La Vita Nouva.....
Vide Cor Meum!
Um pouco antes,
ou depois,
talvez nunca.....
cai-se-me do peito
uma lágrima...
e ...
afogo-me nela...
devagar.....
tão devagarinho......
que o tempo volta
a passar......
e,
de novo,
Io sono in pace..........
1 - Este tema faz parte duma Ópera ficcional (La Vita Nuova) "composta" especificamente para o filme "Hannibal"
2 -"Vide Cor Meum" ("Vê O Meu Coração") é um tema composto por Patrick Cassidy , baseado no livro "Vita Nuova" de Dante, concretamente o soneto "A ciascun'alma presa", no capitulo 3 dia dita obra.
3 - Foi produzido por Patrick Cassidy e Hans Zimmer e interpretado por:
Libera / The Lyndhurst Orchestra, conduzida por Gavin Greenaway.
Os cantores são Danielle de Niese e Bruno Lazzretti, que interpretam Beatriz e Dante, respectivamente.