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Texto Para Nada

20/1/2019

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À esquerda, tanto quanto me lembre, não havia aquela elevação.
Se olhar em frente, sim!
Tudo me parece igual à ultima vez que por aqui passei.
Teria de pôr os óculos, coisa que não me apetece, porque está frio e sabe-me bem passear de mãos nos bolsos.
Na verdade, pensando bem, nem sei se já era eu da ultima vez que por aqui passei...
Nesse caso seria bem possível que aquela elevação já lá estivesse mas o eu que sou hoje não estava aqui para o ver...
Ou, talvez estivesse distraído, coisa vulgar nos humanos, vivemos em minúsculas bolhas nem chegamos ao proverbial boi a olhar para um palácio porque nem chegamos a olhar!
Tudo é possível no fundo, um outro eu teria dados num dos bolsos, sentar-se-ia no chão frio e jogaria a decisão.
Que decisão seria caso a ver... 
Meio à direita, no que alguém mais versado em aeronáutica chamaria de pelas duas horas, vejo nitidamente uma árvore de que me recordo.
Ou, penso que me recordo, já devo ter visto muitas árvores e neste caso pode ser a desolação dos ramos nus de folhas contra o céu cinzento que me faz confundi-la com todos as outras que achei parecidas connosco.
O comboio que passa embala-me...
Tento acertar os passos com o ritmo...
Esvazio-me, sem sucesso, para tentar deixar entrar-me no cérebro todas as vidas que nele viajam...
Sempre que se tenta é em vão digo a mim mesmo, pela milésima vez.
Terás de o Fazer, meu caro!
Fico a ver as luzes a desaparecerem ao fundo, já perdido no absurdo das vidas que viveria se cinco de mim viajassem naquele comboio para parte incerta.
Quem diz cinco...
Voltou o silêncio, o que a mim, em principio, me agrada.
Não há silêncio, ora bolas!
Mas, vamos partir do principio que sim, que há silêncio.
Nesse caso o doce murmurar da brisa é imaginação minha.
Fria sim mas não até ao ponto do desagradável... se prestar atenção divide-se no espaço numa estereofonia de mestres consoante as árvores, pedras, pequenos arbustos, com que se vai cruzando no caminho, vem-me pelas costas, mais forte à direita, logo pressinto desse lado um terreno mais descampado, mais sibilante à esquerda, tento entender porquê sem sucesso. Talvez rochas suficientemente arestadas para justificar o quase assobio.
Apuro o ouvido até me assegurar que o ruído dos meus passos deixou de soar... pisar e mover-me sem que ninguém me ouça é o mais perto que consigo de voar e sorrio sempre que o consigo.
Gosto de imaginar que algo parecido com leveza de alma seja necessário para tanto.
Tenho os pés frios claro.
Curiosamente, uma vez encontrado o ritmo do movimento silencioso, parar pode ser a morte do artista.
Tem que se prever a paragem uns cinco ou seis passos atrás e ir desacelerando gradualmente.
Para que tudo isso me serve não sei bem, mas executo religiosamente o exercício.
Exercito o desprezo pelas possibilidades que se me oferecem, com um pontapé desdenhoso numa pedra.
Não porque sejam más, mas porque más ou boas me parecem iguais.
Roleta russa é roleta russa basicamente só tem um resultado.
Parece-me meio evidente que se optar pelo caminho da esquerda vou ter de lidar com a tal pequena elevação de que me não recordo... e, se for em frente com alguma coisa minimamente familiar.
No entanto, se me não recordo da elevação por ter sido outro eu a ter aqui passado, então a minha memória do caminho em frente será necessariamente falsa.
Os dados dariam jeito definitivamente.
Ou outra coisa qualquer.
Se tivesse uma mochila pesar-me-ia nas costas e talvez assim sentisse o peso da existência.
Por exemplo.
Assim vou andando, a entropia expectável encarrega-se de me pesar o suficiente, mas o caminho, não sendo a descer, não é certamente a subir.
Lá ao fundo há luzes o que me lembra humanos, calor, lares...
Cantarolo mentalmente um tema do Selling England By The Pound sem saber porquê... creio que pela delicadeza com o que Steve Hackett aborda a viola nesse tema em particular e ficaria bem neste agora em que me encontro.
Tento mudar de agora, como quem muda de camisa.
Não consigo à primeira, se por falta de jeito ou falta de inspiração momentânea não sei, mas quero mudar a musica na cabeça antes que se torne obsessiva e grito.
Gosto do eco.
Num dia bom, num agora com bom eco, com três silabas apenas já se consegue criar uma bela secção rítmica.
E bons pulmões claro.
Paro, para olhar em volta e imaginar um hemisfério sobre mim.
Começo a desenhar nele portas como se fossem possibilidades.
Forço-me não sei bem a quê, mas apetece-me imaginar que apenas uma delas tem, de facto, saída.
E, estranhamente, continuo a acrescentar portas.
A dificultar-me!
Não faz sentido e num gesto afasto o hemisfério.
Deixo as portas por engano, mas parece-me justo.
Gosto de portas assim, perdidas no espaço, sem ombreiras que as justifiquem.
Gosto de outras coisas, como caminhar à noite no meio de lugar nenhum, mas isso já deve ter parecido evidente.
Também se pode caminhar acompanhado mas isso é toda uma outra realidade.
Se pudesse parar o movimento de rotação da Terra ia ser noite para sempre, penso, num recanto do cérebro, com a sensação que isso não me desagradaria.
Se a pudesse parar poderia de facto estar parado como penso estar.
Vou lançado pelo espaço fora a cerca de um milhão de quilómetros hora e só a bolha gigante que isto é torna a viagem confortável.
Vou eu e ides vós mesmo dormindo imóveis como pensam estar.
Portanto, parado de mãos nos bolos quer apenas dizer de mãos nos bolsos.
O resto é falso!
Recomeço a andar reconfortado com não sei bem o quê, mas sabe-me bem e não me apetece discutir comigo mesmo porque raio fiquei de repente ridiculamente bem disposto.
Lembro-me do outro e das cartas de amor.
Que são ridículas dizia.
Encolho os ombros: bem lembrado mas nada a ver...
O facto de já nem me lembrar se optei pela elevação à esquerda ou pelo caminho em frente parece-me irrelevante:
Era-me igual logo porque ou para quê recordar um pormenor insignificante?
Apresso o andar só porque me apetece sentir uma urgência que não tenho.
Estaria igualmente bem parado (já falámos sobre essa impossibilidade) ou, até, a andar no sentido inverso.
Ou noutra direcção como já bem vimos sendo que esse é um factor multiplicador dado que cada direcção terá os costumeiros dois sentidos logo as possibilidades aumentam.
Teria sido melhor ter ficado com aquilo das portas creio:
Estava razoavelmente bem desenhado no espaço, embora invisível, e volto a dizer gosto de portas.
Sem ombreiras.
Que as justifiquem.
Nem tudo terá de ser justificável.
E quanto a possibilidades, reparem, um revolver tem seis balas.
O que quer dizer que se encher só uma câmara ou lá como se chama o sitio onde se mete a bala a disparar, vou ter um sexto de probabilidade de ir desta para melhor directamente sem grandes sofrimentos.
Calma, nem revolver tenho, mas se me invento 32 portas e me conto um conto em que só uma delas tem saída vou ter um sobre trinta e dois avos de sair bem do labirinto.
Claro que as balas são literais, por assim dizer.
Não menos literal pode ser a determinação de qualquer um para seguir à risca as regras dos jogos que joga.
Afinal de contas pode-se até ter dado o caso de ter começado a passear por sitio ermos para evitar batoteiros que torcem as regras assim que a coisa lhes corre mal.
Mas não é o caso.
É puro deleite na verdade.
Teria de ter melhor memória que aquela que me assiste para me lembrar agora se o deleite é o passeio ou o raio dos labirintos que vou inventado no percurso.
Paro e sento-me para reflectir sobre o assunto....
Lembro-me de ter visto um homem cair ao Arno e o meu rosto não mover um músculo. Se isso faz de mim um monstro?
Não necessariamente, na verdade duvidei da probabilidade daquilo acontecer perante os meus olhos.
Depois, claro, voltei ao inicio:
Monstro ou não monstro não podia fazer nada e lembro-me de reflectir na altura que o facto da corrente o afastar para longe me poupou a mais incómodos.
Claro que o Arno aqui não era literal.
Ou talvez fosse, e o afogado  sim não era literal e foi apenas uma das cinquenta vezes que me lembro de morrer.
Nunca ninguém tocou piano na minha morte, que me lembre, e mesmo eu fiquei a ver-me afastar, sentado no muro, de pernas a dar a dar... de rosto impávido e sereno.
Fosse eu mestre do mundo e não mudaria uma virgula.
Nem pararia a corrente.
Mas acrescentaria o piano, que seca morrer em vão, ao menos que haja musica.
Ou que se passeie.
Ou que se ouça o comboio passar...
Ou que se fique sentado, na beira dum qualquer rio, de pernas a balouçar, a ver a corrente lavar-nos.

Ou nada!

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